quinta-feira, 18 de junho de 2009

A compensação

Pelo amor de Deus, não me venham com faixas dizendo “EU ACREDITO”. Essa é a mais derrotista de todas as formas de motivação de um time de futebol. Para uma equipe de futebol experiente como esta, não será necessário este tipo de apelo sentimentalóide, tão exercitado pela torcida do Fluminense, em 2007. Deu no que deu: LDU !

O que me conforta é receber torpedos de tricolores, elogiando o gol do Ronaldo. Já? Assim, tão cedo? A respeito do time da Azenha, recomendo a leitura do artigo do Sérgio Xavier, no Jornal da Placar, intitulado “Um Grêmio de Argila” - http://jornalplacar.abril.com.br/blogs/sergio-xavier/gremio-argila-174770_p.shtml .

Recordo-me da história de um amigo de infância que, ao final de uma árdua, tensa e difícil concretização de um negócio, que lhe tomou meses de trabalho árduo, cansativo e estressante, mas que lhe reconfortava porque o resultado melhoraria muito a vida da empresa e de muitas pessoas. Para relaxar, chutou o balde e se foi ao comércio de corpos local. Lá chegando, contratou os serviços profissionais de quatro, vejam bem, eu disse QUATRO moçoilas e resolveu todos os seus problemas. Quer dizer, quase todos: já meio tocado com as cervejas que tomara antes, pagou a conta com cartão de crédito. E esqueceu do fato. Chegada a fatura na humilde residência, a titular, subiu nas pantufas, estufou o peito, enchendo ainda mais o chambre para cobrar, com imposição física e moral, as devidas explicações: - Mas o que é isto? Onde foi que tu gastou setecentos e quarenta reais? E o meu amigo, calmamente, rodado no assunto, respondeu: Tu não tem jeito mesmo. Estragou a surpresa! Esqueceste que daqui a dez dias estamos de aniversário de casamento? A mulher, ainda que desconfiada, desfranziu o cenho, fazendo desaparecer as duas rugas surgidas intempestivamente entre as sobrancelhas. O chambre desinchou-se, apenas a pantufa, em ato involuntário, teimava em lustrar o piso. Vendo que a situação se acalmara, meu amigo ganhou a rua sob o pretexto de comprar um filé com nata para a janta. E dali ganhou as ruas da cidade, de joalheria em joalheria, procurando por um par de brincos, uma pulseira, um colar, o raio-que-o-parta que custasse exatamente os setecentos e quarenta reais para, ainda naquela noite, selar a paz conjugal.

Encontrar o resultado após a derrota de ontem à noite não passa, evidentemente, apenas pela corrente de pensamento positivo da nação colorada. Passa, ao revés, pelo exame dos erros cometidos durante a partida que nos colocou em complicada situação para o jogo da volta. Passa pela consciência de que não tínhamos uma defesa com três zagueiros, o que permitiu a Marcelo Oliveira usufruir de uma avenida pela direita. E pela falha na cobertura de Marcelo Cordeiro, com muitas dificuldades de parar Jorge Henrique. E porque Magrão simplesmente teve sonegada a cadência e o domínio da bola, em virtude da velocidade do jogo, fruto, também, da modificação do sistema defensivo, com um ala e um zagueiro que, ainda que tenha velocidade, ainda não percebeu que, na área, não se dá bote. Da mesma maneira, a chave para a vitória passará pelo domínio do jogo, pelo controle da bola, pela triangulação que ontem funcionou em três lances, todos salvos por Felipe. E se fizermos gol cedo, passa por marcar as cobranças de faltas, impedindo que elas sejam feitas rapidamente, como Elias reconheceu que faz sempre e nunca houve problema algum.

Manter a cobrança, por parte da diretoria, a respeito da complacência do apitador, que não excluiu nenhum dos quatro jogadores do adversário que estavam pendurados pelo cartão amarelo. Chicão, em um deles, parou um contra-ataque e sequer recebeu admoestação do árbitro. Mas isso é papel para o Fernando Carvalho. E isso já está sendo feito.

O grupo deve se fechar em torno do objetivo, estudar o adversário incansavelmente, pensar alternativas para o jogo e buscar a máxima e sublime concentração. Nem preciso lembrar de Magic Paula, que após receber a medalha de ouro das mãos do comandante-em-chefe Fidel Castro, cunhou a célebre “no esporte, o mais bonito é a superação”.

No nosso caso, nem se trata disso, pois a qualidade prepondera, sempre. A qualidade, com Nilmar e Kleber, aliada ao maior nível de testosterona, que também é importante nestas horas, porque na verdade se trata de, como o meu amigo, após um desatino buscar um desafogo, procurar e encontrar um presente de igual valor: dois a zero. Mas se for possível comprar um presente por três gols de diferença, sofreremos um pouco menos.

domingo, 7 de junho de 2009

(H)Ora pro nobis, filho



O nome do homem de amarelo para Cruzeiro e Inter, nas Alterosas, foi Antônio Hora Filho. Confesso que nunca havia ouvido falar no dito cujo. Afora Fluminense e Botafogo, em que Fred desencantou e marcou o gol da vitória do Tricolor do Parreira, não havia outros clássicos pela quinta rodada, em que perdemos nossos primeiros dois pontos.


Então, todos olhavam para nós naquele que seria uma prévia do grande jogo do campeonato, que se daria naquele ensolarado segundo domingo de setembro, com transmissão da Globo para todo o país, desta feita, direto do Gigante. O jogo foi nervoso, com lances de karatê, kung-fú e taekwondo, em especial uma voadora do Bolívar que, tomou amarelo e, depois disso, segurou o amarelo durante o jogo inteiro. E foi o dia em que nem o papai Lauro, talvez depois de tantas noites insones, agüentou Kleber, o bolero mais chato, marrento, malandro e anti-herói do futebol brasileiro, desde os tempos de Edmundo – no Palmeiras, porque nos outros clubes em que jogou, era injusto chamá-lo de Animal, tamanha a sua docilidade. No aguardo de um escanteio, Kleber deu um empurrão em Marcelo Cordeiro. Lauro tomou as dores, chega perto de Kleber que pisa no seu pé esquerdo, bem em cima do joanete, que dói pra burro e, como se tivesse recebido aquelas batidinhas do martelo do médico no joelho, nosso goleirão dá uma “botinada” na canela da “vítima”. O juiz aconselha-se com o bandeirinha, expulsa Kleber pela fama construída e pela péssima interpretação no “ai-ai-ai-minha-canela”, e o Lauro pelo “ato-reflexo involuntário” perfeitamente compreensível. Saímos na frente, com uma cabeçada certeira do Magrão, em cobrança de escanteio, em que um petrificado Fábio nada pôde fazer – que sina que goleiro do Cruzeiro tem em não esboçar reação quando toma gol de cabeça do Inter, como Raul, no gol iluminado” do Figueroa, em 1975. Com a expulsão do Lauro, saiu Alecsandro e entrou Michel Alves, com sua cachoupa agarrada na cabeça, que fez minha cara-metade perguntar: - Cruzes, quem é esse? É o Michel Alves, respondi, calmamente, temendo pelo pior que, nestes casos, é o eventual desdobramento da pergunta em outra ou outras: De onde ele saiu? Do Juventude, respondi, quase fechando os ouvidos, pois já sabia o que viria, que vem de longe minha ciência sobre a íntima relação que todas as mulheres do mundo têm com goleiros: NÃO VAI ME DIZER QUE É AQUELE QUE TOMOU 8 GOLS, ANO PASSADO, UM DELES DO MEU CLEMER ? Ai meu Deus, tamo ferrado ! Mas Michel Alves recuperou-se bem da quase-falha que culminou em gol, de modo que, depois do empate, montamos nosso traiçoeiro ferrolho, com uma linha de quatro, outra de três e meio e um solitário Taison, ainda descontado, lá na frente, mas sempre levando pavor aos zagueiros adversários. Além disso, nem todas as vozes desmentiam a evidente falha do auxiliar, pois Wellington Paulista estava flagrantemente impedido quando chutou para o gol após o rebote do Michel Alves. Mas não estávamos, neste ano, para chorar o leite derramado.


Naquele 7 de junho, em que um médico do Real Madri chegava à Recife para fazer curativo no Kaká e leva-lo para o Santiago Bernabeu, tirando-o do Berlusconi que se juntava a Sarkozy e vencia o parlamento europeu, o Mengo fez dois gols em nove minutos e tomou quatro, do Leão, na Ilha do Retiro. Também o Porco, de virada, tirou a vice-liderança do Vitória, no Parque Antártica, por dois a um (que deveria ser dois a dois, pois um dos milagres de Marcos só pode ser assim considerado porque o auxiliar não viu que a bola entrou). Aliás, era digno de nota o que o Marcos fazia pelo Porco, não apenas pelas suas defesas e não-defesas - como uma em que ele ficou no chão umas quatro vezes, tentando impedir o chute a gol - mas porque a gente sempre podia esperar um bate-boca dele com o Luxa. O super Avaí segurou o Tricolor e o Muricy, na Ressacada, sem mexer no placar. Celso Roth despediu o Geninho que havia sido, dias antes, o único motivo para o Paulo Baier ingressar no Atlético Paranaense e o Galo Mineiro sagrava-se, assim, o vice-líder da quinta rodada. O jogo dos Santos (André e o Peixe) foi um eletrizante 3 a 3. O Grêmio meteu, na quinta-feira, três a zero no Náutico, selando a paz momentânea entre Souza e Maxi Lopes. Goiás e Barueri lutavam e empatavam entre si, numa disputa particular para ver, antes, quem tinha mais possibilidade de cair. Por fim, o Corinthians fez o placar clássico no Coritiba, deixando-o com a lanterna na mão.


Sabemos todos que o mundo da bola muitas vezes nos prega peças, mas em outras reconstitui retratos de um passado vivido repetidamente por nós mesmos ou por outras equipes. Na quarta, 3, vencemos o Coritiba por 3 a 1, no Gigante, pela Copa do Brasil. Vejam só quantas coincidências, ali mesmo, já se manifestavam: a) após a derrota no jogo de ida, a direção do Coxa incendiou a torcida com uma campanha baseada na mais derrotista de todas as frases, “eu acredito”, epíteto de uma das maiores tragédias do Fluminense (derrota na Libertadores, para a LDU, ano passado), para tentar nos vencer; b) o Coxa, como nós, completava cem anos logo ali adiante e todos sabemos que, em alguns casos, é melhor comemorar logo o 101o aniversário; c) agarrava-se à zona de rebaixamento como um faminto a um prato de comida e já na quinta rodada estava a quatro pontos do primeiro não-rebaixado – já que seu saldo negativo era muito alto; d) e, finalmente, como nós passamos da euforia (a possibilidade de disputar a final da Copa do Brasil de 1999) à depressão profunda (a partir da goleada sofrida para o Juventude em pleno Gigante), o time salvando-se na última rodada do Brasileirão daquele ano, com um gol de cabeça do Dunga contra o Palmeiras, tudo sinalizava que o Coxa passava a correr esse sério risco.


Àquela altura do ano, lia, atenta e lentamente, Veneno Remédio – O Futebol e o Brasil, de José Miguel Visnik, Cia. das Letras, uma viagem incrível e profunda no mundo da bola. E o destino do Coxa naquela semifinal da Copa do Brasil, fez-me lembrar da passagem que Visnik lançou na pág. 69, que faço questão de reproduzir aqui:


Levi-Strauss compara o futebol ritualizado dos nativos da Nova Guiné aos ritos funerários dos índios fox, que visavam a propiciar a partida dos mortos sem despertar nestes o desejo de vingança, motivado pela “amargura e (...) saudades” de não estarem mais entre os vivos. Tais ritos, “indispensáveis para convencer a alma do morto a partir definitivamente para o além, onde assumirá o papel de espírito protetor, são normalmente acompanhados de competições esportivas, de jogos de destreza ou azar, entre dois campos constituídos de acordo com uma divisão (...) em duas metades (...); o jogo opõe vivos e mortos, como se antes de se desembaraçarem definitivamente dele os vivos oferecessem ao defunto o consolo de uma última partida”. Nessa partida das partidas, o time do “morto” deverá vencer sempre: “prescrevendo (...) o triunfo da equipe dos mortos, dá-se a estes (...) a ilusão de que são os verdadeiros vivos e que seus adversários estão mortos”, já que “ganhar um jogo é ‘matar’ o adversário”. Trata-se, então, de aplacar a ameaça contida na morte através da inversão do placar sagrado: os mortos são vivos e os vivos são mortos. Ou melhor: os mortos prevalecem sobre os vivos (dado que estes não têm escolha sobre a morte) e os vivos prevalecem sobre os mortos (pelo simples fato de estarem vivos) – com o que a luta duplamente desigual dá em empate. É o caso também de um outro rito dos mesmos povos algonquim “onde os neófitos se fazem matar simbolicamente pelos mortos, representados pelos iniciados, a fim de obter uma suplementação da vida real ao preço de uma morte simulada”.


Quer dizer, assim como o Palmeiras, que tomou cinco do Grêmio na Libertadores de 1995, no Olímpico, e depois fez os mesmos cinco no Parque Antártica, ficando de fora porque tomou um, sempre é importante acreditar que se está vivo neste tipo de competição. Todavia, quem tem a vantagem de saber ter matado o adversário e introjeta este trunfo na consciência vence, porque como os nativos da Nova Guiné, deve-se permitir aos mortos um último desejo, uma última vontade, uma última vitória.


Não dava para dizer que o (H)Ora Filho prejudicou o Inter ou o Cruzeiro, naquela quinta rodada; só dá pra dizer que ele apitou muito mal. E depois de constatar este fato, só me restava lembrar da genuína culinária mineira que saboreei no Ora Pro Nobis da encantadora Tiradentes, em fevereiro de 2008.


segunda-feira, 1 de junho de 2009

Um apelo às TVs: mostrem o Inter

Ugo Giorgetti

Falei do passado na última coluna e me dei mal. Disse que não houve incidentes na partida entre Corinthians e Fluminense em 1976, e que tudo se passou em santa paz. Fui corrigido pelo meu velho amigo, e grande diretor, Julio Xavier, citado na coluna e que, na ocasião foi ao Maracanã.

Ao contrário do que afirmei, o carro do Julio foi emboscado na entrada do Rio, com gente pisoteando o capô, a lataria sendo afundada, vidros quebrados e sua camisa do Corinthians arrancada violentamente. Mulheres que estavam no carro também não foram poupadas. Ele me diz, por fim, que soube de facadas e tiros. É isso que dá mexer no passado. Never more.

Por isso quero hoje me dedicar ao presente, e começo com um apelo. Senhores responsáveis pela programação das TVs, pensem um pouco nos pobres telespectadores de S.Paulo. Parem de nos mostrar jogos como os desta semana. Ainda há nesta cidade pessoas que gostam de futebol. Por favor, transmitam os jogos do Internacional de Porto Alegre. Não só em TV fechada, mas aberta, para todo o país, talvez em rede nacional como os pronunciamentos do presidente.
Não adianta mostrar estádios lotados, com multidões esperando milagres de times medíocres. O Vasco deu pena. O time é horrível e, graças a Deus, entrou com um uniforme que nada lembrava o grande Vasco de outros tempos. O Corinthians, por sua vez, entrou de branco da cabeça aos pés, coisa que me lembrou o grande Santos, naturalmente, é claro até a bola começar a rolar. De Palmeiras e Nacional de Montevidéu nem é bom falar, tamanha a mediocridade.

Por que nos são os oferecidos esses jogos? Simples: nunca olhamos as coisas que estão perto. Só vemos o que está longe e daí a razão de assistirmos embevecidosa a Barcelona e Manchester.

Nada contra, são grandes times.

Mas bem aqui, a uma hora e meia de voo de S.Paulo e Rio, se jogam um futebol de extraordinária qualidade do qual vemos aqui em S.Paulo apenas os gols e alguns lances nos noticiários noturnos. É pouco. Eu quero, e acho que muitos comigo, ver mais, muito mais de Taison, Andrezinho, Alecsandro, D'Alessandro e do magnífico Nilmar, de quem até Dunga foi obrigado a reconhecer o talento. Quero ver o Inter de Tite, um treinador que fala às vezes de modo misterioso, mas que transmite honestidade, respeito. Aliás, sua saída do Palmeiras foi exemplar. Preferiu deixar o clube a ser desrespeitado. É assim que procede um homem. Tite agora está colhendo o que merecia.

Enquanto os outros times apostam só no físico, na "determinação" e na monotonia da bola parada, o Inter aposta na bola no chão e no talento. No talento, na jogada individual, no drible em coisas que se julgavam perdidas para sempre.

É claro que para jogar assim é preciso ter talento. Mas descobri-lo e valorizá-lo não é a maior das virtudes, o maior dos méritos?Os meninos do Internacional não surgem do nada. São descobertos, treinados e lançados por gente que tem a cabeça no lugar e sabe o que faz. Inclusive contratar, quando necessário. Não é um time imbatível, pode nem ser campeão, mas muitas vezes o campeão não é o melhor. É só campeão. Por isso renovo o apelo: quando quiserem mostrar futebol, aquele velho futebol, arte, que ninguém sabe exatamente o que é, mas reconhece quando vê, por favor, virem seus olhos e câmeras para o Beira-Rio.

domingo, 24 de maio de 2009

O que pode ser pior que fazer prova ?

- Só tem duas coisas piores do que fazer prova, disse Clarinha, oito anos, olhos muito azuis, fitando a estrada que insistia em não repetir paisagens: - morrer e desmaiar! Não sei o porquê da ordem estabelecida pela autora da genial resposta, mas a percepção que o ser humano tem de tudo que acontece ao seu redor é sempre marcada por um grau elevado de dramaticidade, afinal o que pode não ser nada para a maioria dos mortais, para nós é simplesmente vital. O que se constitui em um rematado absurdo, pois se todos habitamos o mesmo planeta, comemos com a boca, ouvimos com os ouvidos e sentimos os cheiros das coisas pelo nariz, fico um tanto quanto atônito quando um “semelhante do sexo masculino” diz que não gosta de futebol. A primeira coisa que penso é que, evidentemente, esse ser é de outro planeta. Ao depois, dependendo da resposta, como, por exemplo, se o sujeito diz que gosta de ciclismo e de jiu-jitsu, passo a ter certeza de que se o cara não é um E.T., por certo, é "chipado".

Pois bem, o mítico dia 20 de maio de 2009, em que batemos o Flamengo e assim avançamos para as semifinais da Copa do Brasil contra o também centenário Coritiba, trazia elevada eletricidade no ar a que estava, confesso, desacostumado. Já escrevi que não acredito em superstição (embora a isso não se equipare, por exemplo, sentar na terceira cadeira à esquerda, da décima quarta fila, à direita de quem entra pelo portão 8 do Gigante), tendo, inclusive, desenvolvido uma tese extensa e muito bem fundamentada a respeito do assunto. Mas, porém, todavia, contudo, as horas que precederam ao grande jogo foram angustiantemente periclitantes, pois perdi minha carteira e precisei conseguir uma emprestada. E, como se sabe, grandes jogos no Beira-Rio trazem um pouco de preocupação quanto ao acesso, já que o estádio, com capacidade para 50 mil pessoas, não conseguia mais acomodar os 88 mil sócios, número anunciado naquela noite.

O clima no ar era pesado. Procurei agarrar-me a alguns fatos que foram marcantes, naquela semana. O primeiro deles, Juan havia brigado com Cuca, na segunda-feira, por causa do excesso de treinamentos. Pensei: vamos fazer um gol, logo, com falha do Juan. Depois, quando o Mengo empatou, procurei pensar em coisas boas e as imagens das partidas em que ao invés de sofrermos gol, no final, o fizemos, renovavam-me as esperanças. Ibson, um craque “do futebol moderno” – que é diferente do craque de antigamente que se afirmava como nome próprio – fez uma falta absolutamente ridícula em Glaydson, que se não fosse pela falta não ofereceria nenhum perigo ao gol de Bruno.

Então, quando Andrezinho e D’Alessandro posicionaram-se para bater a falta, aos 43 minutos do segundo tempo, pude perceber claramente o que ocorreria. Lembrei-me de Cláudio Olímpio e do Edinho, dizendo que Andrezinho tivera poliomelite, perguntando como “é que vocês aguentam esse cara”. E lembrei da polêmica sobre a contratação (que não aconteceu) do Petkovic pelo próprio Flamengo, seus desdobramentos com a demissão-não-demissão do Kleber Leite por conta do fato. E lembrei do gol do Pet no Vasco, em 2001, aos 43’13” do segundo tempo, um golaço de falta em que a bola viajou um metro para fora do campo e depois entrou no ângulo. E que isso não acontece por acaso. E, então, tudo veio de roldão porque essas coisas todas não acontecem por acaso, elas se repetem. Como Nilmar copiou Maradona, dez dias antes, Andrezinho repetiu Petkovic, colocou a bola, com a mão, no ângulo de Bruno e, inapelavelmente, despachou o Mengão da Copa do Brasil. O Coxa venceu a Ponte com um gol no final, em pleno Couto Pereira, onde decidiríamos tudo, dali a duas quartas-feiras. O Corinthians, após abrir dois a zero em pleno Maracanã, deixou o Flu empatar, mas garantiu a classificação por ter vencido o jogo da ida por um a zero. O Timão faria a outra semifinal contra o Vasco, que empatou com o Vitória em 1 a 1, não sem antes tomar um susto, com um gol logo nos primeiros minutos.

A terceira rodada do Brasileirão não trouxe grandes surpresas: o Tricolor bateu o Fogão, no Olímpico, com direito a gol de bico do Jonas. São Paulo e Palmeiras empataram sem gols num Palestra Itália com muito pouca gente. O Galo Mineiro ganhou do Leão na Ilha do Retiro e preparou a queda de Nelsinho. Celso Roth, como sempre, começava bem, mas também já se sabia que terminaria como sempre terminava. O Fluminense tomava 4 do Peixe, em pleno Maracanã. O Vitória foi ao Mineirão e deu mais uma lógica, com a vitória do Cruzeiro. Santo André e Flamengo se engalfinhavam, mas o segundo ganhava, enfim. Avaí e Coxa, em Florianópolis, empatavam, em um jogo redundantemente igual. O Náutico, talvez a única surpresa, foi à Arena, pródiga em tragédias, e venceu o Atlético Paranaense, de virada.

No sábado, havia ido ao Queens, em Bento. Acomodei-me junto ao balcão e mentalizei uma vitória sobre o Goiás, em pleno Serra Dourada. Era o jogo em que Harley completava trezentos jogos com o Goiás, pelo Campeonato Brasileiro. Lamentavelmente (para ele, não para nós), Harley tomaria mais um gol, aos trinta e dois do segundo tempo, uma linda cabeçada de Taison que aparou um cruzamento certeiro de Marcelo Cordeiro. Luiz Carlos Jr., no Sportv, de maneira profética, disse: Com Taison em campo, pode-se esperar tudo! Poupamos, no jogo, D’Alessandro, Nilmar, Kleber e Índio. Taison entrou no segundo tempo, aos 15, logo depois de Sandro ocupar a vaga de Magrão. A grande notícia do jogo foi a volta de Sorondo, soberano na bola aérea, uma verdadeira tranqüilidade para o Lauro que fez uma das mais lindas defesas do campeonato, aparando com a mão uma bola desviada à queima roupa e de canela pelo Sandro.

Àquela altura do campeonato, liderávamos com cem por cento de aproveitamento. Em segundo lugar vinham Náutico e Atlético Mineiro com sete e, em terceiro, com seis, Cruzeiro e Vitória. O UOL reproduzia, como frase da semana, a de Taison: “Esse gol serviu para mostrar que não sou jogador só de gauchão”. E, em destaque, arrematava: “Inter bate Goiás por 1 a 0 e dispara na liderança”. O Terra anunciava: Inter vence e é o único 100%, referindo-se ao fato de que alcançávamos a liderança do campeonato sem tomar um único gol, em três rodadas.

Sobre o que poderia ser pior do que fazer prova, lembrei-me de que Roland Garros começava naquele domingo e que três brasileiros, além de Thomaz Belucci, superaram o qualifyng e se credenciavam a disputar a chave principal: Franco Ferreiro, Thiago Alves e Marcos Daniel. Olhando a chave, vi que o último deles, justamente o colorado de Passo Fundo Marcos Daniel, pegaria ninguém mais ninguém menos do que Rafael Nadal, em plena quadra central. Clarinha ainda não sabia, mas há coisas bem piores do que fazer prova, morrer e desmaiar.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

“O Colorado já é líder”


Em manchete, o diário eletrônico globoesporte.com anunciava que o time misto do Inter vencia o Palmeiras no Gigante e chegara à liderança do Campeonato Brasileiro


O carro voava pelas ruas da Tijuca, pouco depois da meia-noite. Havia pouco, estivera no Maracanã com o Edinho e o Cláudio Olímpio, dois flamenguistas doentes e, como qualquer outro torcedor, vítimas de privação temporária dos sentidos. Nós, torcedores, somos assim mesmo, não há dúvida quanto ao fato. Afinal, qual lógica, que não a mágica, poderia explicar que os dois, aos gritos, pedissem a entrada do Obina e, ao primeiro erro do sósia do Eto’o, para logo em seguida mandarem ele tomar naquele lugar que para a maioria tem apenas uma única e exclusiva função? Pois foi o que ocorreu. Mas o que me chamou a atenção, verdadeiramente, foram os comentários do Gerson “Canhotinha de Ouro”, na Rádio Globo: “– Esse Índio, que heresia, alguém comparou com o Figueroa, esse Índio “num” joga nada... Esse Taison, esse moleque que dizem que é melhor que o Robinho, “num” joga nada. Esse “De Alessandro” (foi bem assim que ele demonstrou todo o seu conhecimento sobre futebol, pelo menos sobre o nosso), esse “De Alessandro” (repetiu, buscando inspiração), esse “De Alessandro” eu vi aqui, ninguém me contou, ele passou correndo aqui defronte da cabine da Rádio Globo, esse “De Alessandro corre nos calcanhar” (assim, assassinando a língua de Camões), esse argentino não joga nada!”, vociferou.


O tempo de reação dos flamenguistas (que a momentânea “perca” dos sentidos acaba pouco depois que homem de preto diz que, lamentavelmente, todos temos que ir para casa que amanhã é outro dia e que aquilo tudo é só um jogo de futebol!) me deixou um pouco mais tranqüilo: “o Gerson bebeu”, disseram, quase em uníssono. E eu poderia dizer “não, ele “fumou”, cerrrto?”


Mas o fato é que o empate sem gols contra o Mengo em pleno Maraca servira apenas para continuar a fazer o mundo pensar que não “éramos tudo aquilo” que o Lédio Carmona e o Alex Escobar haviam anunciado e que um único sábio ousara discordar, porque é dado a sofrer arroubos de profeta – como se isso não fosse atributo exclusivamente meu, pelo menos aqui neste espaço -, o Wanderley Luxemburgo. Naquele meio de semana, pela Copa do Brasil, para registro histórico, o Tricolor das Laranjeiras perdera para o Coringão pelo placar mínimo, no Pacaembú, o Vasco, amargando a Série B, havia feito o placar mais ilusório de todos, como os fatos mostrariam na semana seguinte, um 4 a 0 sobre o Vitória e o Coxa arrancara um empate em dois gols com a Ponte, em Campinas.


A segunda rodada do Brasileirão iniciara no sábado com uma derrota amarga do Tricolor para um Celso Roth, que após o jogo, mostrou-se mais inflado do que o Fausto Silva (aliás, todos sabem que a diferença entre o Fausto Silva e o Gugu Liberato redonda, digo, redunda, exatamente, em dois quilos e um terno Armani de 10 mil dólares!). Àquela altura do campeonato, o ex-treinador do Grêmio preferido da torcida do Inter, engordava o Galo, vingador das Alterosas. O mais discutido no jogo foi a “forma de tratamento dispensado pelo Senene” que, segundo o Souza, estava sendo grosseiro e rude com os jogadores. Nem o pênalti cometido pelo Joílson, que reconheceu que a bola tocou no seu cotovelo, aos 47 minutos do segundo tempo e que o Diego Tardelli converteu, deixando o Vitor de joelhos, causou tanta grita do co-irmão quanto à descortesia e má-educação do apitador. A FIFA iria “ser comunicada dos fatos”, disse o presidente Duda Kroeff, e nós ficaríamos sem saber o resultado do imbróglio. O São Paulo, num jogo cheio de erros de arbitragem em que um deles foi o pênalti sonegado em Marcinho, conquistava o seu primeiro ponto no campeonato ao empatar em 2 com o Atlético Paranaense, em pleno Morumbi. O Coxa, poupando-se para o jogo da volta contra a Ponte, tomou de quatro do poderoso Santo André, no mítico Alto da Glória. O Fogão empatou com o Fofômeno, no Engenhão. O Fluminense repetiu o time da estrela solitária e apenas empatou com o Barueri. O Cruzeiro tomou dois do Náutico, no mesmo Aflitos em que goleamos o Timbú por três a zero, semanas antes. No clássico nordestino, o Vitória foi melhor, venceu o Leão da Ilha, ferido em sua estima pela eliminação na Libertadores por São Marcos, dias antes, e dividia, com idêntica campanha, a liderança do campeonato. O Peixe empatara com o Goiás que também dividia com o Coxa, surpreendentemente, o melhor e o pior ataque do campeonato (saldo zero para seis gols marcados e sofridos).


Mas voltando ao Luxa, o fato era que o nosso efêmero ex-lateral esquerdo já não gozava mais da simpatia da nação colorada. Em entrevista à Rádio Gaúcha, pela manhã, Luxemburgo dissera que o Inter precisava ganhar o Brasileirão ou outra coisa para ser reconhecido como favorito no jogo e no campeonato. E emendou: “não é ganhando torneio de segunda-linha como a Sul-Americana que vai fazer do Inter o melhor time do Brasil”. Para que todos saibam, o sistema de monitoramento que montamos no mundo inteiro nos permite adicionar estes pequenos elementos à preleção de antes dos jogos, uma espécie de doping positivo junto ao estado anímico da rapaziada. (Blogpé: o monitoramento é possível a partir de convênio estabelecido com a NASA, que gentilmente nos disponibilizou seu sistema de satélites, pois como todos sabem o Obama é colorado já que a avó queniana dele andava por aqui, no início do século passado, e ajudou os Poppe a fundarem o Inter).


Então, o Taison jogou, inventou outro drible, muito parecido com o La Boba, fazendo Pierre perder o avião no dia seguinte, pois teve que ir até a rua Coronel Vicente, no centro de Porto Alegre, atrás de uma agulha para poder tocar o LP do Waldick Soriano (grande palmeirense) que ganhou na lombar, entre L5 e S1. O Glaydson furou em bola, digo, deixou ela passar e o Danny Moraes emendou rasteiro, rasante, sem chance para o Marcos, treinado pelo avô do algoz, Valdir de Moraes, que ao final do jogo disse estar “feliz e insatisfeito” com o feito do neto. Ou coisa que o valha.


Jogamos aquela partida com quatro titulares e um banco de reservas que tinha Michel Alves, Giuliano, Guiñazu, D’Alessandro, Nilmar, Kleber e Sorondo. Os “titulares” que começaram: Lauro (que seria vendido logo em seguida, pois naquela partida olheiros ingleses, assombrados, viram ele estufar o peito e bloquear uma bomba à queima-roupa de Keirrison, aos 47 do segundo tempo, salvando o gol de empate e permitindo um contra-ataque que se traduziria em gol de D’Alessandro, enlouquecendo a torcida para o jogo da volta da Copa do Brasil, na quarta-feira, ali mesmo naquele campo sagrado), Danilo, Bolívar, Danny Moraes e Marcelo Cordeiro; Glaydson, Sandro, Andrezinho e Rosinei; Taison e Alecsandro.


A torcida saiu às ruas, feliz da vida, divertindo-se com o comentário de nosso eterno presidente, Fernando Carvalho: - o final de semana foi emocionante para os secadores: uns, ontem, comemoraram gol aos 47 minutos do segundo tempo (referindo-se ao Galo vingador que sangrou o Tricolor, no finalzinho); outros, hoje, não tiveram a mesma sorte (referindo-se ao milagre de Lauro e à decepção dos gremistas). O globoesportes.com estampou, no próprio domingo: Colorado JÁ É líder.


Edinho e Cláudio Olímpio disseram que viriam ao Gigante, junto com a nação rubro-negra. Não levava muita fé no que diziam, mas eles acreditavam em Obina e Zé Roberto, que haviam sido respaldados pelo Cuca, no calorento vestiário do Maracanã, logo após o Mengão arrancar suado empate contra o valente Avaí, de Evando e Marquinhos. Adriano Imperador, recém chegado à Gávea, teve que apartar briga entre Juan e o Cuca na manhã daquela segunda-feira. Aldemiro Dantas, que na semana anterior, depois do gol antológico do Nilmar dissera que o Inter ia “levar o cacete” no Maracanã calçou as sandálias da humildade e mandou mensagem em que dizia que era bom os colorados irem comemorando a liderança conquistada frente ao Porco, porque na quarta-feira, no Gigante da Beira-Rio, o Mengão iria “arrancar” a classificação de qualquer maneira.


Enquanto isso, Tite e Cleber Xavier quebravam a cabeça para montar o time a partir das ausências de Índio e Magrão. Três dias antes do jogo, havia apenas 3.300 ingressos disponíveis para o jogo que valia vaga na semifinal da Copa do Brasil. A torcida, como faria outras vezes ao longo do ano, levaria o time nas costas e, daquela feita, as travas das chuteiras não ficariam marcadas na areia, mas arrancariam leivas do melhor gramado do país.


terça-feira, 12 de maio de 2009

Polvo de Estrellas

Naquela noite de 12 de maio, vieram-me à mente os versos de Jorge Drexler, em "Polvo de Estrellas"

"Se aprende na escola,
se esquece na guerra,
um filho te volta a ensinar.
Está no espelho,
está nas trincheiras,
parece que ninguém parece notar.
Toda vitória é nada
Toda vida é sagrada
"

Ernesto Cardenal, em meu ouvido, sussurrou baixinho seu "Canto cósmico":

"O que há numa estrela? Nós mesmos.
Todos os elementos de nosso corpo e do planeta
estiveram nas entranhas de uma estrela.
Somos poeira de estrelas.
"

Então, um homem, apenas, transformou-se em poeira de estrelas e a luz que irradiou cegou seus adversários, transformando aqueles 17,68 m2 em algo do tamanho de uma caixa de fósforos.

E Marcos venceu o Sport, em plena Ilha do Retiro. E virou lenda !

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Submeter ou dominar


Nilmar brilha e faz o gol mais bonito do campeonato brasileiro de 2009, logo na estréia contra o Corinthians

Alex Ferguson é quem diz que o time que tem a posse de bola tem mais chances de vencer. Possuir a bola é ocupar os espaços do jogo, controlar o tempo e dominar o adversário. Dominar ou submeter? Que diferenças poderiam ser apontadas nessas duas ações que, aparentemente, querem dizer a mesma coisa?


Até os 20 minutos do primeiro tempo entre Palmeiras e Coritiba, sábado, 9 de maio, na abertura do Brasileirão, no Palestra Itália, nenhum dos dois times permaneceu com a posse de bola mais do que 20 segundos. Havia escolhido esta partida para acompanhar, porque os outros dois jogos não ofereciam maiores atrativos, àquela altura do campeonato: o Sport, com reservas, empatava contra o Barueri, na Ilha, poupando-se para o jogo da volta, pela Libertadores, contra o próprio Palmeiras. O curioso, neste jogo, é que o gol do Barueri foi muito engraçado: de dentro da grande área, quase da linha de fundo, o atacante deu uma bomba que bateu no peito e braços do goleiro, que achou que a bola havia saído. Só que a bola subiu, subiu, subiu muito e foi picar na frente do gol, cheia de efeito, batendo na rede, junto ao travessão. Em tempos de gripe suína, um gol “espírito de porco”. Detalhe internético: o gol saiu no Marca da Espanha. Na Ressacada, o Avaí também empatava, na sua reestréia na Série A, contra um Galo vingador que reagiu e bem, após sair perdendo por dois a zero.


Na véspera, fizeram uma enquete com os 20 capitães da Série A para que apontassem (não valia o seu próprio time) quem seria o campeão brasileiro de 2009. Dos dezoito votos possíveis (já que o Guiñazú não poderia votar, sendo covardia exigir que o Tcheco fosse inteiramente sincero em sua escolha), 13 afirmavam que o Internacional seria o campeão Brasileiro. E de lambuja, o Ronaldo Fofômeno era apontado como o artilheiro, mas tinha Nilmar em seu encalço, estando apenas invertida a ordem, como, afinal, se viu.


No domingo, a Raposa depenava o Urubu, em pleno Mineirão, com dez em campo, desde o primeiro tempo. O Cruzeiro havia vencido o Universidade de Chile, na quinta, por dois a um, em Santiago, pela Libertadores. O Flamengo esperava fazer frente a nós, no Maraca, quarta-feira, 13, pelas quartas de final da Copa do Brasil, tarefa que se mostraria inglória. O Vitória venceu o Atlético, na Baixada, por dois a zero, na reestréia do Carpeggiani como técnico da Série A. O Fluminense, com uma bomba de Maurício, da meia-direita que entrou no ângulo, venceu o São Paulo, no Maracanã, pelo placar mínimo.


Mas é evidente que o golaço do ano foi feito, exatamente, na nossa estréia, frente ao Timão. Nilmar recebeu um lançamento de D’Alessandro de 40 metros, dominou a bola com o lado de dentro do pé direito, encostou-a na coxa, a dona redonda caiu no gramado e ele saiu em disparada, no sentido oposto, na diagonal, da direita para a esquerda. Passou por seis jogadores, deu uma última parada quase no bico da pequena área - o que fez com que o último zagueiro tocasse um LP do Vicente Celestino entre a L4 e L5 - e então, quase caindo, tocou no canto esquerdo de Felipe. Várias e várias vezes, a cena foi repetida. William e Fátima encerraram o Jornal Nacional, felizes, contentes, mostrando o gol ao Brasil inteiro. Todos, sem exceção, renderam-se à genialidade do lance e ao talento de Nilmar. Na noite seguinte, no Bem Amigos, todos pediram a sua convocação para a Seleção Brasileira que iria jogar a Copa das Confederações. Cuca, que treinava o Mengão, à época, afirmou, na segunda, que ele era a única pessoa no mundo que contara quantos toques na bola Nilmar havia dado: doze. Cuca, numa reação catatímica, nadava contra o repuxo para dizer que não considerava o Inter favorito, nem no Brasileiro, nem na Copa do Brasil. Bem se diz que os catatímicos não são bons para trabalhos periciais... Também outras reações foram colhidas da primeira rodada: Jean, um dos seis que ficaram pelo caminho e que milagrosamente não sofreu nenhuma lesão, no lance, disse que o Inter “não era um bicho de sete cabeças”, o que era uma verdade verdadeira. O Brother Menezes, cria da casa, que começou o seu aprendizado no suplementar “C” do Gigante, sobre o genial gol de Nilmar, citou o sábio e filósofo Rui Ferrer Di Santi, cria de São José do Ouro: “O bom cabrito não berra, não chora. Quando é a favor, a gente vibra”. Falcão disse que Nilmar correu mais rápido do que o Usain Bolt, já que descontada a bola, tudo resolveu-se num sopro de onze segundos. Seguiram-se Nilmar fenomenal (Wianey Carlet), Nilmaravilha, Nilmaradona e a manchete, preciosa e precisa do Caderno de Esportes da Zero Hora: “Um gol para Ronaldo Ver”. Uma foto menor, ao pé da página, mostrava Ronaldo olhando o vazio, o nada. Depois, dizem que ele foi embora do Pacaembu, pois não tinha mais nada para fazer ali. Uma colega escreveu de Minas para dizer que embora não fosse boleira e não entendesse nada de futebol, via-se obrigada a mandar parabéns, como se uma mínima parte do esforço, do ar e de cada larga passada de Nilmar, tivesse um pouco de todos os colorados espalhados pelo planeta.


Do jogo propriamente dito, lembro-me de poucas coisas: Lauro fez uma única defesa, no segundo tempo, quando o Timão teve a posse de bola, boa parte do tempo; Taison (descontado por uma lesão sofrida na quarta-feira anterior contra o Náutico) errou um gol debaixo dos paus, no primeiro tempo, o mesmo ocorrendo com Índio, pouco depois. Magrão e Bolívar não foram bem. D’Alessandro foi à São Paulo apenas para mandar um passe espetacular que fez Nilmar pensar “depois desse, eu vou pegar a bola, passar por um, dois, três, quatro, cinco e, depois, vou dar um corte no sexto, vou ajeitar o corpo e vou tocar no lado esquerdo do Felipe. Depois vou correr pro abraço e mandar um beijo pra dona Marisa, que hoje é dia das mães”. O gol de Nilmar além de genial e histórico, deu a sensação, não a nós, mas aos 9 reservas do Coringão (Brother Menezes é muito esperto, mesmo!) que era melhor não mexer com aquele time: sofrer uma derrota pelo placar mínimo estava de bom tamanho. E o que ninguém no mundo, na vida, no planeta Bola percebeu, só eu percebi: quando o Nilmar dribla o último zagueiro e ajeita o corpo para fazer o gol mais bonito do campeonato brasileiro de 2009, no canto do vídeo, embaixo, D’Alessandro já está com os braços erguidos, comemorando...


Dominar o jogo é permanecer com a bola onze segundos, driblar seis jogadores do time adversário, permanecer em pé, ter o tempo que os outros não têm para reagir em um átimo, e, ao fim de tudo isso, fazer parecer que jogar futebol é muito simples. E assim o fazendo, passar a impressão ao adversário de que se ele reagir será pior, porque ele não foi submetido, mas apenas dominado, confirmando o que Sir Alex Ferguson e, logicamente, D’Alessandro já sabiam.